Não quero mais assédio moral e sexual, discriminação, salários diferenciados, terceiro turno, ser a lavadeira, a passadeira, a cozinheira e a amante. Não quero flores, bombons ou um medíocre gesto de gratidão. Quero igualdade, dignidade, liberdade e ser a dona da minha história.
Texto da jornalista Ines Ferreira
Chega de rosas vermelhas! Abaixo os cartões coloridos, os chavões, as mensagens repetitivas de enaltecimento as diferenças ou de reforço ao consumo e a estética. Nada de frases banais que não produzem mudanças na mentalidade machista e arcaica desta sociedade.
Neste Dia Internacional da Mulher deixe a hipocrisia de lado, tire a roupa pesada e desconfortável da agressão, da repreensão, do preconceito e da indiferença que impede o apoderamento dos direitos.
Hoje, vamos aproveitar a data para usar a “coragem” que nos atribuem para falar a verdade.
De mulher pra mulher, esta data nada tem haver com flores ou qualquer outro símbolo estético presente na mídia.
Este é um dia de luta, que começou com a incorporação do trabalho feminino nas indústrias, em plena Revolução Industrial e por consequência da Segunda Guerra Mundial. Um dia que marca o começo de uma luta coletiva que vem atravessando décadas e serve de exemplo por todos os gêneros.
Hoje, dia 8 de março, nada de rosa -choque, de pink de vermelho paixão.
A cor do Dia Internacional da mulher é cinza. O cheio não é de Chanel n 5, mas de carne feminina queimada. O cenário é de horrores envolvendo 146 trabalhadoras que tiveram seus corpos carbonizados num incêndio criminoso na fábrica da Triangle Shirtwaist, em New York.
Não estamos comemorando somente as conquistas, mas o começo e o símbolo da luta por direitos e consequentemente a liberdade.
Luta que precede a queima de soutiã em praça pública. Antes de ter coragem de exibir os seios, as mulheres que protestavam tiveram seus corpos queimados (25 de março de 1911), porque protestavam por melhores condições de trabalho. Muitas décadas depois ocorreu o protesto divertido Bra-Burning, ou ‘a queima dos sutiãs’ (1968).
A luta das mulheres começou com uma base política sólida e com muito preparo. Antes de tirar a roupa, mulheres que faziam roupas, se debruçaram na literatura do Partido Socialista para organizarem as operárias da indústria do vestuário de Nova York, as primeiras a entrarem em greve.
Antes de protestar em concursos de beleza, as operárias organizaram a Conferência Internacional de Mulheres, em Copenhague, dirigida pela Internacional Socialista, quando foi aprovada a proposta do Dia Internacional da Mulher pela socialista alemã Clara Zetkin.
Foi assim que tudo começou. Antes da guerra de sexos, mulheres usaram seu poder de sedução no mundo das ideias, na política, como ocorreu na Rússia, em 8 de março de 1917.
Essa comemoração do Dia Internacional da Mulher foi certamente muito diferente das que vemos atualmente. Naquele ano o Dia Internacional da Mulher foi o estopim da Revolução Russa. Nessa data ocorreu a greve das operárias da indústria têxtil contra a fome, contra o czar Nicolau II e contra a participação do país na Primeira Guerra Mundial precipitou os acontecimentos que resultaram na Revolução de Fevereiro.
Estas mulheres maravilhosas chamaram atenção de Leon Trotsky que afirmou o seguinte :
“Em 23 de fevereiro (8 de março no calendário gregoriano) estavam planejadas ações revolucionárias. Pela manhã, a despeito das diretivas, as operárias têxteis deixaram o trabalho de várias fábricas e enviaram delegadas para solicitarem sustentação da greve. Todas saíram às ruas e a greve foi de massas. Mas não imaginávamos que este ‘dia das mulheres’ viria a inaugurar a revolução”.
Após a Revolução de Outubro, a feminista bolchevique Alexandra Kollontai persuadiu Lenin para tornar o dia oficial que, durante o período soviético, permaneceu como celebração da “heroica mulher trabalhadora”.
Depois de tudo ainda inventaram e propagaram mundo a fora a maior de todas as mentiras - que mulher é sexo frágil, que mentira absurda!
Pior, a luta foi esquecida , o significado da data ignorado e por fim transformaram em feriado comercial uma das datas comemorativas mais importantes da luta de classes e de trabalhadoras..
Ninguém lembra faz questão de dizer que esta é uma data política e de luta.
O Dia Internacional da Mulher tornou-se um dia para demostrar o amor as mulheres por meio de flores, cartõezinhos, vídeos carregados de emoção, meros cumprimentos sem comprometimento.
Mas hoje, vamos fazer diferentes. Vamos dizer a verdade.
Sem essa de dor de cabeça, cansaço – a palavra correta é não quero.
Não quero mais assédio moral e sexual, discriminação, salários diferenciados, terceiro turno, ser a lavadeira, a passadeira, a cozinheira e a amante.
Não quero flores, bombons ou um medíocre gesto de gratidão.
Quero igualdade, dignidade, liberdade e ser a dona da minha história.
(Ines Ferreira é jornalista e assessora de imprensa de diversas entidades sindicais. Trabalhou em Jaú e atualmente mora em Bauru)