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Apesar de ter alterado substancialmente a rotina da população, de empresas e governos, a pandemia do novo coronavÃrus ainda não abalou o calendário das eleições municipais deste ano nem as regras e condições para a disputa.Â
A maioria dos partidos e a Justiça Eleitoral defendem que, se as eleições forem adiadas (a data oficial é 4 e 25 de outubro, em primeiro e segundo turnos), que sejam por um curto perÃodo, evitando assim o prolongamento do mandato de prefeitos e vereadores eleitos em 2016.
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O fundo eleitoral, de R$ 2,035 bilhões, também permanece por ora reservado para a campanha dos candidatos, como defendem os principais partidos, e não para uma nova função, o combate à pandemia, como pregam alguns isoladamente.
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O principal argumento ouvido pela Folha nas últimas semanas foi o de que a atual crise mundial não pode servir de pretexto para a fragilização de um dos pontos fundamentais das democracias, as eleições.
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"Não se faz uma eleição sem despesa. E é melhor fazer com uma despesa clara do que fazer como era antes", afirma o presidente do PSB, Carlos Siqueira, em referência ao financiamento empresarial das campanhas, fonte de vários escândalos de corrupção e que está proibido desde 2015.
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Para o presidente do Solidariedade, Paulo Pereira da Silva, eleição sem o fundo eleitoral seria um caos e abriria margem para "caixa dois para todo lado".
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Assim como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ele diz que o governo até poderia usar nesse momento o dinheiro do fundo nas medidas de combate à doença, mas com recomposição da rubrica lá na frente, no perÃodo de campanha.
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A extinção do fundo ou o seu uso para outros fins é bandeira empunhada especialmente pelo partido Novo e por congressistas do PSL ainda aliados a Jair Bolsonaro, esses últimos sem o controle da verba do partido, já que romperam com a cúpula da legenda e agora tentam criar a Aliança pelo Brasil.
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Em linhas gerais, eles defendem ser um escândalo o uso de dinheiro público para financiar candidatos em um paÃs tão carente como o Brasil.
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Alguns, como o presidente do MDB, Baleia Rossi, adotam discurso maleável, como o de que, "se a emergência exigir", o partido não se oporá ao uso do fundo no combate à pandemia.
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Nos bastidores, porém, a opinião majoritária no Congresso é a de que não serão os R$ 2 bilhões do fundo que farão diferença em uma situação que exige valores muito mais altos. Segundo esses parlamentares, os que pregam a destinação ao coronavÃrus surfam na onda anti-polÃtica e querem jogar para a plateia, uma movimentação que tende a perder força com o passar dos meses.
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O Novo tem entre suas fileiras e entre seus apoiadores vários empresários, o que, apontam crÃticos, lhe dá uma enorme vantagem em relação a candidatos de outros partidos que não contam com dinheiro próprio para se autofinanciar.
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Apesar de criticar publicamente o uso de dinheiro público nas campanhas, Bolsonaro se beneficiou dessa verba na corrida presidencial de 2018, como mostraram reportagens da Folha, além de ter recorrido a essa fonte, abertamente, antes de se tornar candidato a presidente da República.
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Em 2014, por exemplo, 97% do dinheiro de sua campanha a deputado federal vieram dos cofres públicos.
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Para tentar afastar de si a imagem de ter sido financiado pela JBS —envolta anos depois em um grande escândalo de financiamento ilegal de polÃticos—, o hoje presidente fez questão de ressaltar publicamente que exigiu que seu partido à época, o PP, colocasse em sua campanha R$ 200 mil vindos do fundo partidário, e não do dinheiro repassado à sigla pela gigante de carnes.
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Até há alguns anos as campanhas eram financiadas majoritariamente pelas grandes empresas, como empreiteiras e bancos. Em 2015 o Supremo Tribunal Federal proibiu a prática, sob o argumento principal de que o poderio econômico feria o princÃpio de equilÃbrio de armas na disputa.
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Com isso, o Congresso criou o fundo eleitoral em 2017, que se juntou ao fundo partidário, com verba de R$ 960 milhões neste ano, totalizando R$ 3 bilhões de dinheiro público em 2020 —além da renúncia fiscal de TVs e rádios para veiculação do programa eleitoral.
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Além disso, candidatos podem receber doações de pessoas fÃsicas ou se autofinanciar, respeitados alguns limites.
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Assim como na defesa do fundo eleitoral, há uma posição majoritária favorável à realização das eleições para prefeito e vereadores ainda neste ano.
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"Menosprezar os atos democráticos, falando como se fosse uma coisa que não é essencial, com algo que se der, faz, se não der, deixa pra lá, o que é isso?", afirma o presidente do Cidadania, Roberto Freire.
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A oposição a um adiamento para além de 2020, que resultaria necessariamente em prorrogação automática dos mandatos de prefeitos e vereadores, também é atacada, entre outros, por Rodrigo Maia e pelo futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Luiz Roberto Barroso (STF).
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Na sessão virtual em que se confirmou sua eleição para o cargo, na semana passada, o ministro lembrou que qualquer alteração nas datas dependerá de aprovação pelo Congresso e que defende o adiamento, se ocorrer, "pelo prazo mÃnimo e indispensável para que elas possam ser realizadas com segurança".
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O TSE criou um grupo de trabalho para avaliar os impactos da pandemia no calendário eleitoral e, até o momento, não há indicativo de necessidade de adiamento.
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A próxima movimentação eleitoral significativa ocorre com as convenções partidárias, que definirão oficialmente os candidatos, marcadas para o perÃodo de 20 de julho a 5 de agosto.
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CALENDÃRIO E REGRAS ELEITORAIS
Cargos em disputa
Prefeitos e vereadores
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Data das eleições
4 de outubro (primeiro turno) e 25 de outubro (segundo turno)
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PerÃodo de convenções partidárias para a escolha de candidatos
De 20 de julho a 5 de agosto
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InÃcio da campanha
16 de agosto
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PerÃodo da propaganda eleitoral no rádio e na TV
28 de agosto a 1º de outubro (primeiro turno)
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Formas de financiamento
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Há três formas principais de bancar uma campanha:
R$ 2,035 bilhões do fundo eleitoral, criado em 2017, distribuÃdos aos partidos, que definem os critérios de repasse aos candidatos (por ora, como defendem as principais siglas, permanece reservado para quem vai concorrer, e não para o combate à pandemia do novo coronavÃrus, como já foi pregado)
R$ 960 milhões do fundo partidário, distribuÃdo à s siglas. Parte desse dinheiro é direcionado
às campanhas (em 2019, foram repassados R$ 928 milhões)
Doações de pessoas fÃsicas e autofinanciamento
Também há renúncia fiscal de TVs e rádios para veiculação do programa eleitoral
Em 2015 o Supremo Tribunal Federal proibiu doações de empresas, sob o argumento principal de que o poderio econômico feria o princÃpio de equilÃbrio de armas na disputa
Como o fundo eleitoral é distribuÃdo
Houve uma mudança da divisão do fundo. Antes, o que valia era o tamanho das bancadas
na última sessão legislativa do ano anterior à eleição (o que contou em 2018 foi a bancada no fim de 2017). Agora, conta o resultado da eleição. A divisão entre os partidos acontecerá da seguinte forma:
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2% distribuÃdos igualmente entre todas as legendas registradas
35% consideram a votação de cada partido que teve ao menos um deputado eleito na última eleição para a Câmara
48% consideram o número de deputados eleitos por cada partido na última eleição, sem levar em conta mudanças ao longo da legislatura
15% consideram o número de senadores eleitos e os que estavam na metade do mandato no dia da última eleição
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Fonte: Folha de SP