
O Ministério da Saúde anunciou nesta quarta-feira (29) que incluiu mais 165 patologias na lista de doenças do trabalho, que são aqueles distúrbios fÃsicos ou mentais causados ou relacionados à atividade profissional. Agora fazem parte da lista distúrbios como burnout, transtornos relacionados ao uso excessivo de álcool, drogas e café, Covid-19, distúrbios musculares, além de alguns tipos de câncer.
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O burnout – ou sÃndrome do esgotamento – é um distúrbio ligado ao trabalho em que o profissional se sente esgotado fÃsica e emocionalmente após ser submetido a condições desgastantes, frequente excesso de trabalho ou metas inatingÃveis. Na prática, a inclusão amplia as chances de os trabalhadores afastados do serviço por doença conseguirem uma estabilidade de 12 meses no emprego após a alta médica.
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A lista foi atualizada após a publicação de uma portaria assinada pela ministra da Saúde, NÃsia Trindade. Com a atualização, a quantidade de códigos das doenças do trabalho passa de 182 para 347. A relação tinha sido atualizada em 2020, após assinatura do então ministro Eduardo Pazuello, com a inclusão de doenças como a Covid-19. Entretanto, a portaria foi revogada cinco dias depois. A primeira versão desse material é de 1999.
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O documento tem duas partes: a primeira apresenta os riscos para o desenvolvimento de doenças do trabalho. Já a segunda estabelece as doenças para identificação, diagnóstico e tratamento. Segundo o Ministério da Saúde, o Sistema Único de Saúde (SUS) atendeu quase 3 milhões de casos de doenças ocupacionais entre 2007 e 2022, conforme dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Desse total, 52,9% foram acidentes de trabalho grave.
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Confira aqui a Ãntegra da nova lista de doenças do trabalho.
O levantamento também aponta que 26,8% das notificações foram geradas pela exposição a material biológico; 12,2%, devido a acidente com animais peçonhentos; e 3,7% por lesões por esforços repetitivos ou distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho.
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“As mudanças na lista vão contribuir para a estruturação de medidas de assistência e vigilância que possibilitem locais de trabalhos mais seguros e saudáveis. A nova lista atenderá toda a população trabalhadora, independentemente de ser urbana ou rural, ou da forma de inserção no mercado de trabalho, seja formal ou informalâ€, informou o Ministério da Saúde.
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Os ajustes já receberam parecer favorável dos ministérios do Trabalho e Emprego e da Previdência Social, e o texto passa a valer após 30 dias da publicação da portaria. A lista faz parte de uma entrega da 11ª edição do Encontro da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador, o ‘Renastão’. A pauta tem como objetivo fortalecer a PolÃtica Nacional de Saúde do Trabalhador.
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Reconhecimento pode garantir benefÃcio do INSS
À Folha de S. Paulo, a advogada Priscila Arraes Reino comemora a inclusão das doenças na lista do Ministério da Saúde após cerca de 20 anos sem atualização – visto que a última mudança foi revogada. Segundo ela, o reconhecimento de burnout, uso de drogas, álcool, cafeÃna e ansiedade, entre outros males, como doenças ocupacionais facilita o acesso dos trabalhadores a direitos previdenciários e trabalhistas, e acende um alerta na sociedade.
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“Serve como um alerta para toda a sociedade e os empregadores. Se a gente está tendo o reconhecimento do Ministério da Saúde de que são doenças ocupacionais, precisa investir em prevenção e olhar de outra maneira para o trabalho que está adoecendoâ€, diz a advogada.
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Quando o trabalhador fica afastado de suas funções por estar temporariamente incapacitado, há direito ao auxÃlio por incapacidade temporária, antigo auxÃlio-doença, pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Nos casos em que o afastamento está ligado a acidente ou doença do trabalho, o auxÃlio é acidentário, e não comum. O auxÃlio-doença acidentário garante estabilidade no emprego por 12 meses após o retorno à s atividades profissionais, recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) pelo empregador e contagem do tempo de contribuição para a aposentadoria.
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Além disso, caso seja convertido em uma aposentadoria por incapacidade permanente —antiga aposentadoria por invalidez— o cálculo é mais vantajoso. O INSS irá considerar 100% da média salarial do segurado para pagar o benefÃcio. Se não for por doença ou acidente de trabalho, a conta leva em consideração 60% mais 2% a cada ano extra que ultrapassar o tempo mÃnimo de contribuição.
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Segundo Priscila Arraes Reino, mesmo estando na lista do Ministério da Saúde, não é fácil o reconhecimento dessas doenças como ocupacionais para garantir o benefÃcio da Previdência Social.
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“É preciso provar a ligação com o trabalho. O atestado tem que ter a CID (Classificação Internacional de Doenças) e deve haver a CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho), mas só perito do INSS que pode reconhecer o tipo de benefÃcio previdenciário a ser concedidoâ€, afirma.
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Caso o INSS não reconheça o direito, o trabalhador pode ir à Justiça e deve provar a ligação profissional. Dentre as provas que podem ser apresentadas estão prints de conversas do WhatsApp, gravações de reuniões e emails, entre outros.
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AuxÃlio-doença do INSS
O profissional que paga contribuições ao INSS tem direito ao amparo da Previdência quando fica incapacitado para o trabalho. O principal benefÃcio pago aos trabalhadores é o auxÃlio-doença, mas há também o auxÃlio-acidente e a aposentadoria por invalidez.
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Há dois tipos:
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1 – Comum: É pago quando há qualquer tipo de doença ou incapacidade que não esteja ligada ao trabalho
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2 – Acidentário: É pago ao segurado que sofre um acidente na empresa ou fica incapacitado por doença ligada à profissão
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O que a lei garante durante o afastamento:
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Os trabalhadores têm direito de receber os valores do INSS durante o afastamento;
Se o pagamento demorar a sair, eles também devem receber os atrasados;
O prazo para pagar os retroativos começa a contar desde a data do inÃcio da incapacidade;
Essa data é definida pelo médico perito, no ato da perÃcia;
No caso do auxÃlio acidentário, há estabilidade de 12 meses no emprego após a volta ao trabalho e pagamento do FGTS no afastamento pelo empregador;
O tempo de afastamento é contado na aposentadoria se estiver entre contribuições, ou seja, se houver pagamento ao INSS antes da doença e depois da alta.
Quais direitos tem o funcionário com burnout, depressão ou outra doença do trabalho?
Ao G1, advogados trabalhistas explicaram quais são os direitos dos trabalhadores afastados por doenças, relacionadas ao trabalho ou não.
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Quando alguém pode ser afastado do serviço por doença do trabalho?
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Para que um funcionário possa ser afastado do trabalho por doença, ele precisa receber um atestado médico com um pedido de afastamento. O que gera o direito ao benefÃcio é a incapacidade de exercer sua atividade profissional por consequência da doença, afirma a advogada Carla Benedetti, mestre em direto previdenciário.
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A partir disso, “os primeiros 15 dias de afastamento serão custeados pela empresa e, após, a responsabilidade é transferida ao INSSâ€, explica Larissa Maschio Escuder, coordenadora da área trabalhista em um escritório de advocacia. Em seguida, o INSS vai submeter o empregado a uma perÃcia médica para avaliar o tempo necessário de afastamento e se ele tem direito ao auxÃlio-doença
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“A perÃcia do INSS avalia se as sequelas realmente impossibilitam o segurado a desempenhar suas funções especÃficasâ€, reforça.
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Quem tem direito ao auxÃlio-doença do INSS?
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Qualquer pessoa que seja segurada tem direito ao auxÃlio-doença, incluindo empregados CLT, autônomos, empreendedores, facultativos ou contribuintes individuais. “E se a pessoa estiver desempregada, ela tem uma carência de 12 meses, no caso de acidente do trabalho, para pleitear o benefÃcio ainda na qualidade de seguradoâ€, pontua Marcelo Martins, membro da Comissão da Advocacia Trabalhista da OAB-SP.
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“O auxÃlio-doença é calculado de acordo com a média simples dos maiores salários de contribuição do empregado ao INSSâ€, esclarece Rodrigo Mattos Sérvulo de Faria, advogado trabalhista.
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E o que muda se a doença for relacionada ao trabalho?
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Quando um trabalhador é afastado do serviço por causa de uma doença relacionada ao trabalho, ele passa a ter o direito de receber o auxÃlio-doença acidentário, afirma o advogado Martins. A diferença desse benefÃcio para o auxÃlio-doença previdenciário comum, que é concedido em casos de afastamento por doença de qualquer natureza, é a estabilidade de 12 meses que garante ao trabalhador para permanecer no emprego após a alta médica, ou seja, ele não poderá ser demitido sem justa causa neste perÃodo.
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“Por isso, o primeiro passo é identificar se a doença tem origem laboral, direta ou indiretamente. Se tiver relação, a empresa precisa emitir a CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho) e aà consegue essa modalidade de auxÃlio-doença com estabilidadeâ€, explica o especialista. “E caso a empresa não reconheça a doença ocupacional, não emita a CAT e afaste o empregado entendendo se tratar de doença comum, o pedido de reconhecimento pode ser realizado em juÃzoâ€, acrescenta a advogada Larissa Maschio Escuder.
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Ela também pontuou que trabalhadores contratados de forma diversa, por meio de contrato de prestação de serviços, por exemplo, os conhecidos “PJsâ€, não possuem direito a afastamento em razão de doença ocupacional. “No entanto, caso seja comprovado em juÃzo que a empresa causou prejuÃzo à saúde do trabalhador, é possÃvel o reconhecimento de indenização por danos moraisâ€, afirma.
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Quanto tempo um funcionário pode ficar afastado por doença do trabalho?
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“O tempo de afastamento deve ser determinado pelo médico que atesta a doença, de acordo com o necessário para que o empregado se recupereâ€, explica o advogado Rodrigo Mattos. Assim, não existe um tempo máximo de afastamento, destaca Larissa Escuder.
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“O funcionário somente poderá retornar ao labor com a alta do INSS e aptidão em Atestado de Saúde Ocupacional realizada por um médico do trabalho.â€
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Cabe processo ou pedido de indenização?
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Sim. A primeira situação que permite ingressar com uma ação trabalhista é se o funcionário teve uma doença do trabalho, mas foi afastado pelo INSS com auxÃlio-doença previdenciário comum.
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“É uma ação contra o INSS para transformar o benefÃcio de auxÃlio-doença de qualquer natureza para auxÃlio-doença acidentário, aquele que garante estabilidadeâ€, explica Marcelo Martins, da OAB-SP. “A consequência é uma reintegração ao trabalho, caso ele tenha sido demitido no perÃodo de estabilidade, ou uma indenização compensatória.â€
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Outra situação é que, mesmo recebendo o auxÃlio-doença correto, o empregado que foi afastado por doença relacionada ao trabalho pode processar a empresa por danos morais, diz o advogado trabalhista Jonas Figueiredo. “A empresa é responsável pela segurança e integridade do funcionário. Nesses casos, é possÃvel mover um processo e buscar indenização por negligência ou falta de medidas de proteção que levaram à doençaâ€, explica.
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Outra possibilidade é mover um processo por danos materiais, se houver perda de capacidade do trabalhador em razão da doença. “Caso o empregado seja acometido por incapacidade total ou parcial, temporária ou permanente, para exercer sua função, é possÃvel pedir em juÃzo, também, a pensão mensal vitalÃcia, cumulada com a indenização por danos moraisâ€, completa a advogada Larissa Escuder.
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Com informações de Folha de S. Paulo e G1
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Fonte:Â Portal CSB - 01/12/2023